sábado, 5 de janeiro de 2008

Pesquisadores estudam a "boa impressão" na web


Stephanie Rosenbloom






É comum que alteremos nosso comportamento e aparência em uma tentativa de controlar como outras pessoas nos percebem. Alguns definem essa tendência como senso comum. Os cientistas sociais a designam "administração de impressões", e atribuem boa parte de sua compreensão do processo ao sociólogo Ervin Goffman, que em um livro de 1959 comparou as interações entre os seres humanos a um espetáculo de teatro. Agora que as primeiras impressões são causadas freqüentemente no ciberespaço, e não face a face, as pessoas não só calculam como transmitir quem elas são, por via virtual, mas também precisam aprender a desenvolver versões eletrônicas de si mesmas que funcionem bem junto a diversas audiências - colegas de trabalho, de estudo, mães e pais.

"Que imagem você apresenta?", pergunta Mark R. Leary, professor de psicologia e neurociências na Universidade Duke, que estuda a administração de impressões no mundo real há mais de 20 anos. Como outros acadêmicos, ele agora está examinando o mundo online com as ferramentas de estudo da administração de impressões - estudos que ocasionalmente oferecem respeitabilidade acadêmica a percepções que parecem óbvias, e em outros casos apontam para conclusões surpreendentes.

"Nós percebemos a profundidade do dilema que as pessoas enfrentam", disse Leary sobre um estudo iniciado em dezembro sobre a maneira pela qual as pessoas editam suas personas online. "Algumas pessoas parecem escolher uma audiência. Outras selecionam apenas seus melhores traços. Porque sou professor, minha página no Facebook tem de ser respeitável. Não posso incluir fotos minhas jogando beer pong".

As pessoas vêm criando representações eletrônicas de si mesmas desde que existe uma web em que navegar, é claro. Mas os estudiosos dizem que a ascensão dos sites de redes sociais e encontros - que tornam fácil dividir com qualquer interessado a lista daquilo que agrada e desagrada uma pessoa, suas perdas e seus sonhos, em uma permutação moderna do questionário de Proust - está levando mais pessoas a "interpretar" um papel, diante dos outros, e de maneiras cada vez mais sofisticadas.

De fato, os sites de redes sociais e encontros atuais "são como sistemas de administração de impressões supervitaminados", disse Joseph Walther, professor de comunicação e telecomunicações na Universidade Estadual do Michigan. Mas, porque eles ainda são formas novas de comunicação, "as pessoas por enquanto não sabem exatamente o que estão fazendo, ou quais são as práticas recomendáveis".

Entre as constatações de Walther está o fato de que a presença de amigos atraentes no perfil de alguém no Facebook afeta a maneira pela qual a pessoa é percebida por terceiros. Em estudo que sairá este ano pelo Human Communication Research, Walther e seus colegas constatam que os usuários do Facebook que têm mensagens de amigos atraentes penduradas em sua "parede" (um fórum público de mensagens) eram considerados significativamente mais atraentes do que as pessoas que apresentavam mensagens de amigos menos bonitos.

"Nós negamos a hipótese Paris Hilton", afirmou Walther, explicando que a hipótese tem por base uma citação atribuída a Hilton: "Tudo que se precisa fazer na vida é sair com os amigos, se divertir sem limites e parecer duas vezes mais bonita" que a mulher ao lado. "Isso não é verdade", afirma Walther.

Diversas das estratégias que as pessoas empregam para se apresentar online e foram identificadas pelos pesquisadores parecerão óbvias para usuários experientes da Internet: melhorar a posição pessoal por meio de ligações com pessoas de status elevado; usar um pseudônimo como "Batman" ou "007" quando na verdade a pessoa se parece mais com Austin Powers; definir a cabeça calva como "raspada" e não "careca"; usar emoticons fofinhos para seduzir o grupo demográfico que gosta de enviar e-mails com mensagens inspiradoras; demonstrar liderança ao estar entre os primeiros a adotar certos aplicativos do Facebook, e convencer outros usuários a fazê-lo; mencionar uma quase carreira como DJ ou modelo, em lugar do emprego que de fato paga as contas; tomar decisões calculadas quanto ao que mencionar como interesses ou livros favoritos.

"Se alguém menciona um livro romeno realmente obscuro, a pessoa é inteligente ou está só sendo pretensiosa?", pergunta Judith Donath, professora associada de artes e ciências da mídia no Laboratório de Mídia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), que estuda aspectos sociais da computação.

Em um estudo sobre romances online, professores das universidades Rutgers, Georgetown e Estadual do Michigan constataram que, na ausência de pistas visuais ou orais, as pessoas solteiras desenvolvem técnicas próprias de apresentação: fiscalizam o tamanho de suas mensagens de e-mail (escrever demais implica desespero); limitam os horários de envio de mensagens (os homens descobriram que enviar mensagens a mulheres de madrugada as incomoda); e anotam o último dia de visita ao site (visitantes que fazem visitas pouco freqüentes podem parecer desinteressados ou, pior, pouco atraentes).

Os estudiosos descobriram que é comum que os usuários dos serviços online de encontros ocultem sua idade ou peso real, ou postem fotos tiradas cinco anos atrás. Em geral, os estudiosos não consideram que a administração de impressões seja uma prática nefasta ou deliberadamente enganosa. É mais ou menos como procurar lubrificação social sem o benefício de um coquetel nas mãos. As pessoas que estudam esse tipo de comportamento online descobriram que, quando as pessoas se representam erroneamente online, muitas vezes é porque estão tentando expressar uma visão idealizada ou futura de si mesmas ¿ alguém mais magro, ou que tenha de fato terminado de ler o Inferno de Dante.

"Todo mundo acreditava firmemente que havia tentado ser honesto¿, disse Jennifer Gibbs, uma das autoras do estudo sobre encontros online e professora assistente de comunicação na Universidade Rutgers. (Gibbs, aliás, conheceu seu marido pelo site de paqueras match.com.) "Eles justificavam pequenas distorções ou falsidades dizendo que queriam se destacar", afirmou, acrescentando que, online ou no mundo real, as pessoas enfrentam essa tensão entre dizer a verdade ou se exibirem à luz mais lisonjeira.

Algumas das distorções derivam da estrutura dos sites de encontros. Por exemplo, as pessoas que decidem se declarar mais jovens em sites de paquera ocasionalmente reduzem sua idade em apenas um ou dois anos, porque de outra maneira não teriam seus perfis exibidos como resultado de buscas organizadas por faixa etária. Gibbs disse que a maioria das pessoas não sentia "qualquer remorso" por esquecer alguns aniversários, desde que a verdade seja revelada caso haja um encontro real com alguém do site.

Revelar distorções cometidas é questão menos importante nos sites de redes sociais, nos quais é menos provável que as pessoas se desviem demais da verdade, já que sua rede de amigos está lá para apontar para as incorreções. Os estudiosos sugerem, porém, que as fotos que as pessoas postam nos sites têm objetivos maiores do que simplesmente mostrar sua aparência. Os membros costumam escolher cuidadosamente fotos que revelem aspectos de suas personalidades.

Catherine Dwyer, assistente de ensino na Universidade Pace e pesquisadora do comportamento online, diz que os homens jovens do MySpace tentam fazê-lo ao posar para fotos em seus carros.

"Uso fotos que me descrevem", diz Leonard Alonge, 44 anos, cozinheiro e ator em Delray Beach, Flórida, que tem um perfil no Facebook. "Fotos que me mostram na cozinha, fotos em que estou com amigos. Uso-as para descrever minha personalidade: amistoso, expansivo, nada muito explícito. Sou um sujeito bastante conservador. Minha família é católica".

Claire Richardson, 17, de Los Angeles, está se candidatando a vagas em universidades, e portanto toma cuidado com o que posta no Facebook, mas sabe que os adolescentes desejam "parecer festivos", afirma. Para isso, postam fotos que parecem apontar nessa direção, ainda que não seja verdade. "É claro que estão tentando impressionar as pessoas todas", disse Richardson.

Keith Hampton, professor assistente na Escola Annenberg de Comunicação, parte da Universidade da Pensilvânia, diz que a idéia de impressionar "as pessoas todas" é parte do problema dos sites de redes sociais. Ele afirma que a administração de impressões só funcionará bem se as pessoas puderem revelar facetas diferentes de si mesmas a diferentes observadores. "Temos motivos reais para querer segmentar nossa rede social".

Mas e as pessoas que pouco se incomodam com aquilo que alguém veja sobre elas? "Hoje, postar materiais reveladores ou perigosos sobre si mesmo pode ser um sinal de que a pessoa se sente imune ao perigo e às repercussões", escreveu Donath em um estudo recente. "Elas podem estar indicando que seu futuro é tão seguro que não há indiscrição em site de redes sociais que possa ameaçá-lo, ou demonstrando que não se interessam por futuros em que a discrição seja necessária. Para esses usuários, o risco representa vantagem".

Tradução: Paulo Migliacci ME

The New York Times

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